quarta-feira, 27 de julho de 2011

Desgraçado

E a dor da vida que pariu um choro irrecusável de carinho já denega o sopro que o criou. Assim começou sua vida. Seus primeiros gritos nunca foram escutados, mas jamais se abateu com isso. Rompeu seu medo da solidão e seguiu a vida com um coração de lâmina incandescente. Quando o menor dos seres se aproximou, o fez cair fundo em um breu sem volta. E sua solidão prosperava junto com sua ignorância.
Todos os dias de manhã sentia o suplício do ar que respirava, sem pena tossia a merda que ainda o deixava vivo, arfando. Pouco sabia de sua queda, sem asas para abraçá-lo, quebrar-se-ia ao chegar ao chão. Triste, quando chorava, vinha a dúvida perpassando seu espírito e o silêncio penetrava qualquer sombra no interior. A vida parecia não convidá-lo, não apreciá-lo, tão pouco fasciná-lo.
No meio da noite, a terra parecia envolvê-lo sem permitir qualquer murmúrio. Nada o deixava sonhar, voar, dançar junto aos anjos. Permitia sua queda, cada vez mais profunda. Todas as portas trancadas por fora, sem chave alguma, sem liberdade.
Suas pernas se esticavam, as rugas cada vez mais visíveis, mas, internamente, nada esclarecia a covardia de se arremessar para o fundo; e ao mesmo tempo a coragem inexplicável para fingir que a dor não subsistia. Seus passos, mais largos e corridos, apressados, querendo chegar logo ao fim do caminho, dissecavam as poucas gramíneas que ainda existiam naquele solo quase infértil, fétido.
Quando crescido, a loucura subjugou sua mente. De todos os pensamentos havia um escondido que pedia sanidade. Seu corpo desnutrido nada mais pedia. Desistiu quando, por um pequeno instante, lhe pareceu são; o suficiente para se ver morto, com os pulsos ainda maculados em sangue.
Nunca ninguém ousou culpá-lo por isso, pois seu corpo ainda está lá, intacto. Os vermes tem medo de putrefazê-lo.

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